Anos atrás, li um artigo sobre escolhas de política monetária entitulado "The conduct of Monetary Policy" escrito por Charles Goodhart, publicado no The Economic Journal, em junho de 1989. Nele, o autor relatava as dificuldades em se empreender de forma eficaz o controle da base monetária, do multiplicador, de diferentes agregados monetários e das expectativas.
Pensando um pouco na experiência brasileira, penso em como é difícil a gestão da política monetária. Lembro que durante o Plano Cruzado, a rápida monetização da economia mostrou que o M1 não foi um bom indicador antecedente. Depois, durante o Plano Collor, percebemos que o M4 também não estava exatamente relacionado com a evolução dos preços na economia. Claro que à época a indexação plena e a regulamentação criavam um cenário peculiar. Mas, também ficou claro que mesmo o controle do multiplicador bancário não permitia obter como resultado o controle de preços com crescimento econômico.
O regime de metas, ao vincular a taxa de juros ao crescimento do núcleo da inflação pareceu permitir um controle mais eficiente da política monetária. Em princípio, sendo a Selic utilizada para calcular os encargos da dívida mobiliária, o grande problema residia no fato de ao elevar juros para controlar preços, elevávamos também o custo da dívida interna. Contudo, uma mudança no perfil da dívida, trocando títulos pós-fixados por títulos pré-fixados, permitiu desvincular parcialmente a condução da política monetária da política fiscal.
Atualmente, o aumento de juros provoca outro impacto indesejado. Agora, o crescimento dos juros leva a uma excessiva valorização do real e prejudica a exportação brasileira de produtos manufaturados. Desta forma, o Banco Central brasileiro optou por adotar neste ano o que chamou de medidas macroprudenciais - redução de prazos para empréstimos, elevação do compulsório entre outros - para evitar o crescimento dos preços sem com isso elevar os juros e colher como resultado a indesejada valorização do real.
Mas, na Europa a condução da política monetária enfrenta outros problemas. O crescimento recente dos preços de commodities no mercado internacional e, em especial o crescimento dos preços de energia acendeu o farol vermelho e levou o BCE no mês passado anunciar a probabilidade de elevação dos juros.
Hoje, esse anúncio se concretizou em um aumento de 1% para 1,25% da taxa de juros. Países como Alemanha e França que possuem saldos confortáveis na conta corrente do balanço de pagamentos devem receber com alegria o anúncio da medida contracionista. A queda ou controle dos preços permite a manutenção dos ganhos reais e evita o descontentamento inerente a uma perda do poder de aquisição. Mas, para países como Portugal, Espanha, Grécia, Irlanda e Itália (países que chamamos de PIIGS), o crescimento dos juros deve acender outro farol vermelho. Os PIIGS estão fortemente endividados. Em grande parte foi a crise financeira internacional que precipitou a dificuldade de rolagem da dívida. Com a crise, a queda nas exportações e as ações de política fiscal expansionista, ampliou a necessidade de financiamento destas economias e apontou para um aumento expressivo no risco de financiá-los. O aumento no risco elevou os juros de captação e ampliou as dificuldades em rolar a dívida.
Portugal divulgou esta semana que vai solicitar ajuda da União Européia, meses depois da Grécia.
Um olhar mais atento me faz perguntar se o preço pago da elevação dos juros faz sentido. Afinal, quais as causas do crescimento dos preços na Europa? Estão eles relacionados com excesso de demanda? Ou, em economias abertas o crescimento dos preços responde a variações nestes mesmos preços no mercado mundial? Pois, se a inflação resulta de choques externos e de choques de oferta, qual o significado da elevação de juros? Não haveria meios alternativos de conduzir a política monetária na União Européia?
Nenhum comentário:
Postar um comentário